20:39

onze

João


Fiquei animado quando Jaime me ligou a pedir para vir buscar a Camila. É uma oportunidade perfeita para estar com ela a sós numa situação casual e ver se sinto mesmo alguma coisa ou se o facto de ter pensado tanto nela durante a semana não passa de uma paranóia passageira.
Ela está ainda mais bonita esta noite. O preto fica-lhe muito bem, contrastando com a sua pele clara e realçando-lhe os olhos castanhos profundíssimos.
- Então, como foi a semana? O chefe estava muito chato? - perguntou-me.
- Horrível! – fiz uma careta. – E a tua semana? 
- Melhor que a tua, ao que parece. Foi assim tão má porquê?
- Oh, stress no trabalho, nem vale a pena perder tempo a explicar, até porque és duma classe superior, que não tem chefes, e não ias entender…
- Que engraçadinho! Sabes que isto de não se ter chefes não é para todos, é só para alguns. Digamos que faço parte de uma elite…
Ri-me, divertido. – Tens razão, sou um mero mortal e jamais aspirarei sequer a um estatuto boss-free como o teu!
Tinha posto a tocar um cd de jazz de propósito e só para ver a reação dela, curioso para descobrir se ela gostava realmente de jazz, como dizia, ou se o dizia só por estar na moda dizê-lo. Resolvi puxar por ela para ver a reacção.
- Gosto muito desta versão…
- Também gosto muito. Gosto muito deste género de jazz, aliás. Não sou muito fã de jazz de big band
- Eu também prefiro este estilo, sem dúvida. Basta um piano, uma bateria…
- ...um contrabaixo, um saxofone e está perfeito!
Sorri por dentro: ela gosta mesmo de jazz, a ver pelo entusiasmo.
- Bem, chegamos. - anunciei. - Vou ligar ao Jaime.
Peguei no telemóvel e notei que ela me olhava de soslaio, tentando disfarçar.  e Camila observava-o atentamente. 
- Segundo a previsão do Jaime, - disse, depois de um telefonema brevíssimo - estão aqui dentro de quinze minutos, mais ou menos. Dado o frio que está lá fora, sugiro que esperemos aqui.
- Acho que é melhor, sim.
 Virei ligeiramente as costas contra a janela para ficar de frente para ela. Olhei-a nos olhos e a pergunta saiu-me de chofre, sem me dar hipótese de a filtrar:
 – Andas com alguém?
Arrependi-me mal me ouvi fazer a pergunta. Para começar, era completamente a despropósito e fora de qualquer contexto, saída do absoluto nada; depois, mostra o interesse que começo a ter por ela, o que é, mais que provavelmente, prematuro assumir, até porque não faço ideia do que sinto, ao certo.
Noto pela expressão dela que foi apanhada completamente desprevenida. Foda-se! Pudera!
- Não, não ando. – respondeu. – Como dizem os terapeutas, estou entre relações. – Brincou.
Fiquei aliviado e sorri com a resposta, era bom que ela não tivesse levado a pergunta muito a sério e era óptimo o facto de estar descomprometida.
- E tu? – devolveu-me.
- Solteiríssimo, – respondi-lhe com um ar solene – para histerismo de muitas mulheres – terminei, com ar de gozo.
- Aposto que sim, que há toda uma legião de fãs desejosas por ocupar esse lugar vazio.
- Claro que há. Tenho um clube de fãs oficial com merchandising autografado e tudo. - respondi, divertido. - Ainda não apareceu a mulher certa, é só isso. - concluí, agora mais sério.
- Vai aparecer, continua a procurar! – incentivou-me, piscando o olho. 
Olhei-a directamente nos olhos.
- Eu sei que vai, – disse, sem desviar os olhos dela – sinto que a vou encontrar um dia destes, em breve.
O telemóvel tocou e atendi a chamada no bluetooth no carro. O Jaime avisava-nos que ele e a Mariana tinham acabado de chegar e já estavam no restaurante com o resto do grupo, que entretanto tinha chegado também. Lá fora chovia. Disse à Camila para aguardar uns segundos e fui à mala buscar um guarda-chuva. Abri-lhe a porta do carro e esperei que ela saísse para a proteger debaixo do guarda-chuva. Tentávamos agora abrigar-nos da chuva que caía sem dar tréguas e caminhávamos encostados, ambos inclinados para a frente e ligeiramente voltados para o centro do guarda-chuva, numa tentativa de nos mantermos secos, o que nos aproximava ainda mais.
- Gostas de sushi? – quebrei o silêncio.
- Nem por isso. O restaurante não era de fondue? - perguntou surpreendida.
- É! - sorri – Era só para saber se gostavas ou não de sushi. O resto do grupo adora, e sinto-me um extraterrestre quando querem ir ao sushi. Se tu também não gostas as próximas saídas vão ser mais fáceis! 
Penso num instante nas coisas que descobrimos ter em comum em tão pouco tempo. Não é que isso signifique nada, até porque o ditado diz que são os opostos que se atraem, mas não deixa de ser agradável ver que temos gostos parecidos nalgumas coisas. Ainda bem que chegamos ao restaurante, não sei se aguentava muito mais tempo esta proximidade debaixo do guarda-chuva sem a beijar.










You Might Also Like

0 comentários

Subscribe